Miguel Ferreira Pestana foi um indígena brasileiro que se notabilizou por ter sido condenado pela Inquisição. Apesar da dificuldade em se recuperar as vidas de indivíduos anônimos que compunham o heterogêneo cotidiano colonial, restritas em sua maioria a fragmentos ou pequenos registros, o indígena Miguel Pestana constitui uma rara exceção neste conjunto.
Natural do aldeamento de Reritiba, no Espírito Santo, Miguel foi preso e julgado pela Inquisição portuguesa sob acusação de feitiçaria, tendo sido surpreendido ao portar uma bolsa de mandinga, prática condenada pela Igreja.
Graças aos interrogatórios e testemunhos registrados no processo inquisitorial, foi possível não apenas desvendar a relação de Miguel com a bolsa de mandinga, tida por ele como fonte de diferentes prodígios sobrenaturais, como também mergulhar no dia a dia deste indivíduo. E, de fato, Miguel Pestana teve uma vida emblemática: marcada pelas fugas do aldeamento em que viveu nas duas primeiras décadas do século XVIII, pelas andanças entre o Espírito Santo e o Rio de Janeiro, a história de tal personagem se destaca acima de tudo pelas variadas relações sociais tecidas por onde passou.
Convivendo em ambientes plurais do ponto de vista étnico, cultural e social, Miguel refletia como poucos esta diversidade: confundindo-se em meio à população mestiça quando viveu nas freguesias do Recôncavo da Guanabara, ele chegou inclusive a ocupar o posto de capitão do mato em Inhomirim, indicando a ascensão social deste sujeito em um cenário escravista e hierárquico. Uma vida que esclarece em grande medida as diferentes existências indígenas no Brasil e que aponta para a violência da colonização sobre os povos originários.
Texto de Luís Rafael Araújo Corrêa
Gostou? Confira o livro “Feitiço Caboclo”, que narra a vida e trajetória de Miguel Ferreira Pestana, lançado pela Paco em 2018:
Ambientado no Brasil setecentista, o livro delineia as andanças de Miguel Ferreira Pestana entre o Espírito Santo e o Rio de Janeiro, destacando os contatos que teve com as práticas mágicas e a religiosidade que circulavam na América Portuguesa – peças fundamentais para a elucidação das interações constantes existentes entre os índios aldeados e o mundo colonial. Quebrando o paradigma do índio passivo e submisso, alheio às transformações sociais impostas pela ordem edificada na América Portuguesa, a trajetória deste indígena se notabiliza, acima de tudo, pelos diferentes contextos nos quais ele conviveu e pelo esforço pessoal despendido para encontrar seu lugar na hierarquia social.
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